Mãe Gabriele

A nossa Mãe Gabriele nasceu no dia 1º de novembro, festa de todos os Santos, no ano de 1896 em Viena, Áustria. Era a segunda de três filhos. Seus pais, Bernhard Göhlert e Friederike van Aken Quesar, eram muito diferentes seja quanto à origem, seja quanto ao temperamento, mas o casamento foi feliz e harmonioso.

Quando Gabriele tinha apenas quatro anos, o seu Anjo apareceu-lhe pela primeira vez. Brincando com seu irmão e outros amigos no jardim, aconteceu que Hermann a fechou no pequeno depósito de lenha. Gabriele, sendo pequena demais, não conseguia abrir a porta. Repentinamente apareceu o Anjo, cheio de luz e amor, e abriu-lhe a porta. Gabriele, radiante, correu logo para a mãe exclamando: “Eu vi o meu Anjo da Guarda!” Sua mãe deu-lhe uma bofetada, explicando-lhe com severidade que não queria mais ouvir essas fantasias e que não voltasse nunca mais com histórias semelhantes. Podemos imaginar o assombro e a dor que esta reação da mãe provocou na alma de Gabriele. E assim ela decidiu nunca mais dizer algo sobre o Anjo da Guarda. De fato, mesmo que o Anjo continuasse a aparecer-lhe, tornando-se o seu amigo, conselheiro e protetor, ela permanecia em silêncio a respeito dele. 

Aos 16 anos Gabriele transferiu-se para Innsbruck para cursar o liceu no colégio das Irmãs Ursulinas. Pouco depois toda a família mudou-se para Innsbruck. Seu irmão mais velho, Hermann, companheiro principal da sua infância, fascinado pelas armas seguiu a carreira militar. Já no início da Primeira Guerra Mundial foi enviado para a linha de frente oriental e lá veio a falecer. Seu irmão menor, Fritz, tornou-se sacerdote diocesano em Innsbruck, onde serviu fielmente no trabalho pastoral até a sua morte em 1986.

Esposa e mãe

Gabriele já conhecia Hans Bitterlich, seu futuro esposo, muito antes de imaginar que se casaria com ele, pois este era irmão de sua amiga Maria, que vivia no mesmo prédio. A relação entra os dois desenvolveu-se de modo muito natural, quando mais tarde se encontraram por acaso frequentando a mesma academia de belas artes. Eles se encontravam também durante a guerra, quando Hans voltava do front para passar algum tempo em casa. Depois da Guerra, por causa da proximidade, retomaram o contato em Innsbruck. Na primavera de 1919 contraíram matrimônio. Logo depois mudaram-se para Bregenz, às margens do Lago de Constança. Lá nasceu a sua primeira filha, Roswhita. Apenas passado um ano a família se transferiu para a Boêmia, onde Hans assumiu a direção de uma fábrica. Lá nasceram os outros dois filhos, Hansjörg e Wolfram.

Em 1928 a família voltou para Innsbruck, onde se estabeleceu definitivamente. Na verdade, voltaram para o mesmo prédio em que viveram durante a sua juventude. Lá, porém, outra dura prova esperava por Gabriele: eles precisavam dividir com a mãe e a tia de Hans o mesmo pequeno apartamento. Durante estes cinco anos, até a morte da tia em 1932, Gabriele fez um grande noviciado na escola do sofrimento silencioso. Encontrou a força para esta via-sacra nas horas de adoração silenciosa diante do Sacrário.

Quando começou a Segunda Guerra Mundial todos os homens da casa foram recrutados para o serviço militar. Os três serviram durante todo o período de Guerra e voltaram sãos e salvos no final do conflito. Já no período da Guerra, o Senhor introduzia Gabriele cada vez mais profundamente nos mistérios da Redenção, com a ajuda do seu Anjo da Guarda. Nesta época, ela recebeu do Senhor os santos estigmas e, a cada semana, começou a dedicar-se às horas da Paixão de Jesus, acompanhado-O na Sua agonia no Monte das Oliveiras e depois na Sua Via-Sacra e nas horas da Cruz. Estas experiências e práticas tornaram-se mais tarde pontos essenciais na espiritualidade da Obra dos Santos Anjos.

Início da Obra dos Santos Anjos

Em meados dos anos quarenta, a Mãe Gabriele começou a revelar os segredos do seu coração e mostrava ao confessor as particularidades da sua intimidade com o seu Anjo da Guarda, pois a sua vida interior se intensificava cada vez mais. No ano de 1949, o próprio Senhor, na vigília da festa de São Marcos, disse-lhe que era chegada a hora e que ela devia escrever sobre os Anjos bons e maus. Confirmada nesta missão por seu diretor espiritual, ela escreveu em obediência sobre o mundo das primeiras criaturas de Deus

Apesar de ter recebido esta missão do Senhor, Gabriele não deixou de ser esposa e mãe de uma família numerosa. Ela devia cumprir todas as suas tarefas com prontidão e amor. Gabriele era tão humilde e discreta a respeito da sua vida interior, que somente muitos anos mais tarde seu marido veio a saber a respeito das suas experiências místicas, quando o seu diretor espiritual, Mons. Walter Waitz, nomeado pelo bispo para acompanhá-la a partir de 1951, informou-o em relação ao contato de Gabriele com o mundo dos Santos Anjos. Hans, o esposo, que no início do casamento não era observante na prática da religião, tinha mudado bastante. Com o tempo, ele mesmo passou a se identificar como protetor da Obra dos Santos Anjos (protegendo a pessoa de Gabriele).

Por aproximadamente trinta anos a Mãe Gabriele continuou a escrever em santa obediência, submetendo todos os seus escritos ao diretor espiritual. O bispo de Innsbruck, Dom Paulus Rusch, ordenou que fosse informado regularmente a respeito dos seus escritos. Duas vezes por ano ela ia ter com ele para uma conversa pessoal. Era também o próprio Dom Paulus Rusch que controlava e aprovava a circulação discreta dos seus escritos. Em vez de inquietação, toda esta vigilância trouxe paz à Mãe Gabriele. Ela própria sentia uma profunda necessidade interior de submeter todos os seus escritos à autoridade e ao juízo da Igreja.

1975: início da Restauração da Ordem da Santa Cruz

Sustentar a restauração da Ordem dos Cônegos Regulares da Santa Cruz foi o trabalho final da vida da Mãe Gabriele. Esta missão começara no ano de 1950, quando Nosso Senhor apresentou o seu desejo de que fosse fundada uma comunidade religiosa como núcleo da Obra dos Santos Anjos, e 25 anos mais tarde chegara a hora da sua realização. Seguindo um conselho recebido em Roma, em vez de fundar uma nova congregação, os sacerdotes procuraram a possibilidade de restaurar uma Ordem antiga. Encontraram a Ordem da Santa Cruz em Portugal que tinha sido suprimida pelo estado em 1834.

No processo de restauração, quando os documentos da antiga Ordem foram estudados veio à luz que esta era a Ordem prevista por Nosso Senhor para realizar plenamente a “vida angélica”, isto é, a vida consagrada em união com os Santos Anjos, conforme uma designação patrística e oriental da vida religiosa. Ninguém poderia imaginar nos anos 50 na Áustria, que os Santos Anjos promoveriam a restauração de uma desconhecida Ordem portuguesa. No Verão de 1977 foi iniciada a restauração da Ordem em Portugal. Durante o primeiro ano, quando a semente começava a germinar, o Senhor chamou a Si a sua serva Gabriele.

1978: Missão cumprida: “bom regresso à Casa”

Tendo sido confirmado que este era o plano de Deus, Gabriele foi chamada a receber a sua recompensa no Senhor no dia 4 de abril de 1978. Ela foi sepultada em St. Petersberg onde passara, nos últimos anos de sua vida, um holocausto oculto de sofrimento pela santificação dos sacerdotes e para a restauração da Ordem. Um dos seus maiores desejos era ver estabelecida a Ordem e ver a Obra dos Santos Anjos solidamente ancorada na Igreja. Tendo isto sido realizado, era agora a hora de se passar de uma liderança carismática para as formas de governo eclesiástico previstas pela Igreja.

Nossa Mãe Gabriele ensinou que, sem humildade e obediência, é impossível cultivar uma relação profunda e frutuosa com os Santos Anjos. Ela ensinou aos sacerdotes que eles deviam descobrir e abraçar o seu “nada” como o verdadeiro ponto de partida, porque enquanto não o fizessem não poderiam iniciar o itinerário espiritual na mão do Anjo, pois o orgulho e a vaidade tornam impossível qualquer colaboração íntima com os Santos Anjos. 

Portanto, precisamos da ajuda e da força dos Anjos se desejamos perseverar na escola da Cruz e chegar à perfeição, se estamos realmente prontos a colaborar eficazmente para a salvação das almas. A palavra final, claro, não é a cruz, mas a ressurreição e a vida eterna. As últimas palavras da Mãe Gabriele são, de certa forma, aquelas que se encontram em sua lápide: “Deus é Bom!”

E este era o seu desejo particular: “Como gostaria de poder compartilhar convosco a minha alegria!” Esta é a missão dos Anjos que a Mãe Gabriele nos indicou através da sua vida em união com eles e através dos seus escritos sobre eles: o caminho árduo da Cruz por um lado, até a alegria e à glória da Ressurreição em comunhão eterna com eles no Céu. 

 1) No ano de 1949 o Domingo Branco (2º Domingo da Páscoa, hoje festa da Misericórdia) caiu no dia 24 de abril. O início da Obra dos Santos Anjos aconteceu da noite de 24 para 25 de abril, ou seja, começou antes da meia noite (portanto ainda no Domingo da Misericórdia) e continuando na madrugada do dia 25 de abril (festa de São Marcos).